O ser humano é um animal racional?

O ser humano é um animal racional?
Alejandro Sanfeliciano

Escrito e verificado por o psicólogo Alejandro Sanfeliciano.

Última atualização: 22 dezembro, 2022

Já ouvimos muitas vezes que o ser humano é um animal racional. Mas isso é realmente verdade? Os estudos acerca do pensamento e do comportamento cotidianos de uma pessoa nos mostram que essa afirmação pode ser incorreta, especialmente se a considerarmos absoluta. Em muitas situações recorre-se ao intelecto humano como fator diferenciador em relação aos animais. Até mesmo o termo animal racional é utilizado com uma conotação de superioridade.

Vamos dividir a reflexão em questão em duas partes para compreender melhor. Na primeira, vamos tratar de esclarecer o que significa ser um animal. E na segunda, vamos falar da racionalidade das pessoas e de como elas fazem uso dessa capacidade.

O ser humano como mais um animal

Com base nos estudos biológicos, o ser humano é categorizado como ser vivo dentro do reino animal. Isso se deve ao fato de que reúne as características e as funções de um animal. Por outro lado, muitas pessoas podem dizer que nós somos dotados de inteligência e de razão, e podemos recorrer a essa particularidade para nos distinguirmos dos outros animais.

Homem em caverna diante do sol

No entanto, a inteligência não deixa de ser uma adaptação ao meio, necessária para a sobrevivência da espécie. Assim como um gato ou um cachorro sobrevivem por possuírem garras e dentes, o ser humano possui a inteligência como mais um recurso para sobreviver. Na verdade, se os humanos não tivessem essa flexibilidade e capacidade cognitiva, possivelmente teriam sido extintos (nós não somos os mais ágeis nem os mais rápidos nem os mais altos nem os mais fortes).

Também há especialistas que defendem que somos a espécie mais adaptada. Na verdade, quando falamos de adaptação e seleção natural, os termos basicamente não têm muito sentido. Uma espécie adaptada é uma espécie que existe sem que haja um perigo de extinção. Portanto, todas ou a maioria das espécies que não foram extintas, no momento, estão adaptadas.

A verdade é que nossa plasticidade nos permite habitar regiões muito diferentes da Terra, regiões com condições muito diferentes entre si. Mas também não somos os únicos a fazer isso. Muitas bactérias são melhores que nós na propagação. Nesse sentido, somos mais um animal, com nossas características particulares, nem melhor nem pior que as outras espécies de seres vivos.

O animal racional

Um segundo aspecto a tratar, em relação à pergunta que dá título a esse artigo, é outra indagação. O que significa racional dentro do conceito “animal racional”? De forma casual, entendemos racional como a capacidade de avaliar os problemas ou acontecimentos de maneira objetiva e responder a eles de forma lógica. Também podemos entender como a oposição de emocional ou instintivo.

Dissociar emocional e racional não faz sentido. Isso é verdade porque a nossa conduta sempre recebe influência da conduta das duas partes, sendo impossível em muitas situações separar uma influência da outra. Sim, é verdade que em algumas situações há mais participação dos aspectos emocionais e em outras dos aspectos racionais. No entanto, mesmo assim não podemos ver esses aspectos como duas maneiras de agir independentes. Ambas se influenciam continuamente entre si.

Mas vamos deixar a emoção de lado. Vamos falar sobre até que ponto o nosso neocórtex é “racional”. Com base na psicologia do pensamento, foi feita uma comparação da lógica humana com a lógica aristotélica. Esta última representa o raciocínio mais puro e matemático possível. Os cientistas perceberam rapidamente que ambas as formas de pensar não coincidiam.

No entanto, se o ser humano não utiliza a lógica no momento de pensar, como é sua forma de raciocinar? Se quisermos encontrar uma resposta, vamos pensar que o ser humano conta com recursos cognitivos limitados e, em muitas situações, precisa agir com rapidez. Se fôssemos capazes de ser “puramente lógicos”, gastaríamos uma enorme quantidade de recursos para tomar cada decisão e seríamos capazes de dar respostas complexas. No entanto, não é assim que acontece, não é mesmo?

Por isso, as pessoas raciocinam através de atalhos mentais, conhecidos na psicologia como heurísticos. Estes são raciocínios baseados na probabilidade e na experiência, direta ou indireta. Em relação à adaptação, é mais rentável fazer um raciocínio provável, assumindo um risco controlado de que não seja correto, do que eliminar esse risco e demorar uma eternidade para tomar decisões.

Mulher pensando racionalmente

O ser humano é um animal racional?

Após observar os dados sobre o pensamento e a conduta humana podemos fazer várias reflexões. A afirmação “o ser humano é um animal racional” precisa ser entendida com muito cuidado e uma certa distância. Racionais ou não, em princípio não podemos dizer que isso nos deixe melhor ou pior posicionados em relação a outros seres vivos quando falamos de adaptação. Por outro lado, os estudos nos dizem que nunca somos estritamente racionais. Na verdade, em muitas das decisões importantes não somos assim e agimos em função do que nos dita a intuição ou o coração (nossa parte mais instintiva e primitiva).

Um termo para nos denominar, cunhado pela psicologia social, é o de “indigentes cognitivos”.  Essa denominação tem uma razão: nossos cérebros estão programados para economizar ao máximo possível os recursos de que dispomos. Em função da importância do acontecimento ou do problema, ele vai realizar um raciocínio mais ou menos elaborado, mas sempre tentando poupar esforços.


Todas as fontes citadas foram minuciosamente revisadas por nossa equipe para garantir sua qualidade, confiabilidade, atualidade e validade. A bibliografia deste artigo foi considerada confiável e precisa academicamente ou cientificamente.


  • Cosmides, L. (1989). The logic of social exchange: Has natural selection shaped how humans reason? Studies with Wason Selection Task. Cognition, 31, 187‐276.
  • Cosmides, L. and Tooby, J. (1992). Cognitive adaptations for social exchange. In Barkow, Cosmides and Tooby (1992), 163‐228.
  • Macintyre, Alasdair (2001) Animales racionales y dependientes: por qué los seres humanos necesitamos virtudes. Paidós
  • Bernal, Anastasio (2015) Psicología social: Algunas claves para entender la conducta humana. Biblioteca Nueva

Este texto é fornecido apenas para fins informativos e não substitui a consulta com um profissional. Em caso de dúvida, consulte o seu especialista.